Inesperadas visitas emplumadas

Ter acompanhado o desenvolvimento de uma ninhada de bicos-de-lacre foi uma das experiências mais emocionantes que já tive, com relatei nesta publicação. Durante semanas só podia ouvir os piados dos filhotes e, quando finalmente deixaram o ninho, pude vê-los descobrir o mundo com seus olhares deslumbrados.

No entanto, sabemos que quando o passarinho cresce, ele quer voar. Tanto nos debruçamos enquanto humanidade a fim de discutir a liberdade, mas talvez seu verdadeiro sentido esteja no voo de uma ave. Como nós, os animais não humanos são dotados de sentimentos, emoções e vontades, não constituindo, portanto, meros avatares sem consciência. No seu dia a dia, os pássaros vão fazer o que têm que fazer e o que querem fazer.

Foi essa compreensão que me faltou nos últimos dias. Os filhotes de bico-de-lacre há tempos não apareciam no meu jardim; logo, eu ficara preocupada com sua integridade, pensando até, a cada grito escutado de uma ave de rapina nas redondezas, na possibilidade de que houvessem sido predados. Ledo engano, pois, quando, há dois dias, na sexta-feira do dia 23 de abril, pude ver os cinco filhotes reunidos, minha euforia se comparou ao dia em que saíram do ninho semanas atrás.
 
Na minha ignorância sobre o desenvolvimento das aves, pensara que eles já seriam adultos a esta altura, após todo o tempo em que andaram sumidos. Mas seus bicos continuam pretos, ainda não alaranjados como devem ficar na fase adulta. De qualquer modo, a cada visita fico mais encantada com seu crescimento: cada vez mais emplumados, mais gordos e mais espertos.
 
Desta vez, já mais crescidos, foi até possível reparar características na personalidade de cada um deles que não reparara nas outras visitas. Pela primeira vez pude ver os irmãos tão próximos, pois geralmente via no máximo dois ou três interagindo entre si. Era uma manhã fria e eles possivelmente estavam se aquecendo. Na primeiro foto da colagem à direita, vemos o segundo pássaro da esquerda apoiando a cabeça sobre o ombro do irmão; noutros momentos percebi que esse comportamento tão fofo era bem freqüente vindo desse pássaro em específico.
 
Até brinquei dizendo que poderia dar-lhes nomes. Mas eles não precisam de nomes. Nós, na nossa arrogância humana, é que temos o hábito de personificar tudo, quando, na verdade, nossos conterrâneos planetários já são especiais o suficiente em suas naturezas sem que precisemos atribuir-lhes aspectos humanos.

O tempo passou, mas nem tanto: eles ainda são filhotes. E filhotes de qualquer espécie gostam de brincar e exercitar sua curiosidade. Talvez não do mesmo modo que os mamíferos, mas tão intensos quanto estes nas suas particularidade e em tudo o que torna especial cada espécie da nossa Terra.


Daniely Silva, 25 de abril de 2021.

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