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Mostrando postagens de abril, 2021

Quando vizinhos tão próximos estão também tão distantes

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UTC (-3) 2021-04-10 23:27:27 6" f/1.8 50mm ISO800   Que angústia olhar para o céu e ao ver Alpha Centauri não saber o que lá nos espera. Talvez seja uma sensação parecida com a tida com relação a Marte e Vênus décadas atrás, ambos os planetas mais próximos de nós do mesmo modo que  Alpha Centauri é o sistema estelar mais próximo. Fantasiávamos sobre as formas de vida que lá nos esperavam, mas nos deparamos com surpresas nada animadoras: no planeta da deusa da beleza, encontramos um inferno da vida real, com um efeito estufa inimaginável e chuva de enxofre; no planeta do deus da guerra, um deserto gelado de atmosfera tão rarefeita que ferveria o sangue humano.   O Cruzeiro do Sul, que junto às suas guardiãs, Alfa e Beta Centauri , serviu de bússola nos céus austrais por séculos, hoje pode nos servir de bússola para olhar em direção às nossas possibilidades para o futuro. Quando olhamos para Rigil Kentaurus , a estrela alfa da constelação do Centauro, na verdade estamos vendo um sis

Inesperadas visitas emplumadas

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Ter acompanhado o desenvolvimento de uma ninhada de bicos-de-lacre foi uma das experiências mais emocionantes que já tive, com relatei nesta publicação . Durante semanas só podia ouvir os piados dos filhotes e, quando finalmente deixaram o ninho, pude vê-los descobrir o mundo com seus olhares deslumbrados. No entanto, sabemos que quando o passarinho cresce, ele quer voar. Tanto nos debruçamos enquanto humanidade a fim de discutir a liberdade, mas talvez seu verdadeiro sentido esteja no voo de uma ave. Como nós, os animais não humanos são dotados de sentimentos, emoções e vontades, não constituindo, portanto, meros avatares sem consciência. No seu dia a dia, os pássaros vão fazer o que têm que fazer e o que querem fazer. Foi essa compreensão que me faltou nos últimos dias. Os filhotes de bico-de-lacre há tempos não apareciam no meu jardim; logo, eu ficara preocupada com sua integridade, pensando até, a cada grito escutado de uma ave de rapina nas redondezas, na possibilidade de que houv

Por que ouço rádio em 2021?

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    Já faz alguns anos que muita gente acha estranho quando falo sobre ouvir rádio nos dias de hoje. Apesar do estranhamento, para mim é só um hábito sobre o qual eu não costumo me questionar o porquê o tenho, assim como não nos perguntamos a razão pela qual usamos smartphones ou acessamos o Facebook, eles simplesmente têm suas utilidades para cada um de nós. Se for pensar numa razão, ela pode ser a praticidade ou simplesmente a nostalgia. No meu caso, voto pela primeira opção: às vezes não quero me esforçar para escolher uma música ou estou enjoada daquilo que costumo ouvir e, assim, deixo que uma estação de rádio faça isso por mim. OK, é reconhecível que os algoritmos dos aplicativos de streaming façam isso melhor que qualquer estação tradicional ou ainda melhor que nós mesmos, mas é aí que entra a questão do hábito, da experiência e, eventualmente, da nostalgia.   Ao longo da vida, uma das principais ferramentas que usei para escutar rádio foi um rádio-relógio de madeira pre

Uma foto que dá errado, mas um momento que fica gravado

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Uma fotógrafa é também uma poetisa, mas sua folha de papel é a paisagem, enquanto sua tinta é a própria luz. A paisagem é tudo o que a vista alcança, mas não só: contemplá-la envolve todo o sensorial, passando por ouvir o quebrar das ondas, sentir a brisa soprar sobre a face, aspirar a geosmina que emana do solo num dia chuvoso. A fotografia tem suas limitações: ela registra uma imagem bidimensional, privando aquele que a vê de todo o conjunto. Mas ela é, acima de tudo, o registro de um momento; momentos nunca voltam, mas seu registro pode permitir revivê-lo enquanto durem os bytes ou os papeis — e enquanto houver alguém que dele desfrute. A foto que abre esta publicação, apesar de simples, acabou me ensinando algo. Trata-se de um registro feito num aniversário meu. Como tanto amo a praia, tenho o costume de visitar alguma cidade litorânea sempre que faço anos. Talvez o litoral seja no mundo meu lugar favorito, em que todo o conjunto de um vento no litoral e o som do quebrar das

O desabrochar de uma vida: o verdadeiro voo se dá fora de uma gaiola

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  Em meio a todo o caos que vivenciamos desta segunda onda da pandemia da Covid-19, com colapso dos sistemas de saúde e vacinação a passos lentos, o dia de hoje acabou sendo especial por um motivo bem singelo. Há semanas me havia dado conta da presença de um ninho de alguma ave no meu jardim: volta e meia e cada vez mais escutava seus piados, eventualmente vendo alguma movimentação de um pássaro adulto, mas que passava tão rápido que mal podia identificá-lo. Após uns dias consegui identificar o ninho — que estava beeem escondido — , mas nunca consegui ver os filhotes enquanto estavam lá. Claro que não cheguei muito perto nem tentei encostar, justamente para evitar problemas entre eles. Pouco depois de ter identificado o ninho, houve uma tempestade tão forte como não via há muito tempo. Como a planta onde está assentado o ninho é razoavelmente frágil, fiquei preocupada que o vento a sacudisse a ponto de derrubar os filhotes. No dia seguinte seguiu-se um silêncio "ensurdecedor"

Datilografando uma história: a sobrevida das máquinas de escrever

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A companhia Godrej & Boyce, a última fábrica de máquinas de escrever do mundo, teve o fechar de suas portas em 2011, em Mumbai, na Índia [1] . O fim de uma era? Apesar de esse fechamento ser um marco, eras não acabam da noite para o dia. Além de entusiastas, é possível que em muitos lugares do mundo as máquinas de escrever ainda tenham algum uso profissional. Como comparação, basta pensar no transtorno causado pelo fim do suporte aos pagers no Japão [2] , tecnologia já defasada que ainda encontrava no país do Sol nascente um número expressivo de usuários.   O processo de substituição de tecnologias é quase sempre uma transição: há dez anos, encontrava facilmente fitas para minha Olivetti em praticamente qualquer papelaria. Mais recentemente, pouco antes da pandemia, procurei por uma em vários estabelecimentos da Região Central e só encontrei em um local; atualmente compro pela Internet, visto que no Mercado Livre há várias opções. Mas a questão é: até quando? Difícil saber, pois t

Navegando pelos sonhos de uma São Paulo navegável

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    O nascimento e maturação do que hoje vem a ser a cidade de São Paulo se deu entre rios. Durante séculos, sua relação com os corpos d’água foi de cumplicidade. J á no século XVI, a vila de São Paulo de Piratininga foi fundada num local em que os habitantes Tupi já haviam escolhido como ideal para habitação: a colina histórica entre os rios Tamanduateí e Anhangabaú.   No entanto, com o advento do automobilismo e a ideia de uma nova cidade para o século XX, os rios paulistanos perderam seu lugar central, tornando-se quintais dos fundos da cidade.     Rios que antes eram caminhos, deram lugar a caminhos de concreto às suas margens ou sobre eles. Bairros inteiros foram construídos sobre as várzeas de nossos rios. É claro que isso teria um preço...     No momento em que comecei a escrever o rascunho desta publicação, aos 10 de fevereiro de 2020, São Paulo passava pela sua maior enchente generalizada desde 1995. Houve bloqueio das avenidas marginais e da Linha 9 Esmeralda da CPTM, a qu

5 línguas que marcaram minha vida

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Muitas vezes, o que pensamos acerca de uma língua diz muito mais sobre o que pensamos a respeito de um certo povo, podendo incluir alguma romantização a que lhe atribuímos. Num antigo rascunho desta postagem, por exemplo, eu incluí o russo; sei muito pouco sobre a língua russa, mas a romantizava, principalmente, porque quando fiz o rascunho, anos atrás, era comunista e o idioma me remetia a uma imaginário muito forte em torno da União Soviética. No caso das línguas planejadas pode ser mais complicada essa relação de sentimentos que desenvolvemos entre uma língua e um povo. Se falamos sobre o Esperanto, que se propõe uma ferramenta de comunicação neutra entre as diversas culturas, seu "povo" estaria disperso internacionalmente. Assim, nunca sabemos bem porque há uma impressão geral tão negativa a respeito do Esperanto; talvez o desagrado seja por conta da própria ideia interna de uma língua neutra e fraterna, tendo em vista que não costumamos ver ataques às outras línguas plan